No dia 11 de julho de 2022 foi publicado o Decreto nº 11.129, que se dispõe a regulamentar a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pelas práticas de atos contra a administração pública. A necessidade de estabelecer parâmetros que tornem eficazes as práticas de governança se balizam na Lei nº 12.846/2013, popularmente conhecida como Lei Anticorrupção.
Detalhes da Lei Anticorrupção e efeitos de sua promulgação
Promulgada em 1º de agosto de 2013, a Lei nº 12.846 tem o mesmo escopo do Decreto nº 11.129/2022, qual seja, de estabelecer a responsabilização administrativa e civil às sociedades empresárias e às sociedades simples, personificadas ou não, independentemente da forma de organização ou modelo societário adotado. Além disso, ainda no parágrafo único do art. 1º, a norma esclarece atingir, também, fundações, associações de entidades ou pessoas, ou sociedades estrangeiras, que tenham sede, filial ou representação no território brasileiro, constituídas de fato ou de direito, ainda que temporariamente.
A Lei Anticorrupção pode ser considerada a mais moderna ação do legislador na tentativa de promover mecanismos de compliance – e a consequente responsabilização pela ausência de ações íntegras – no ordenamento jurídico brasileiro.
Os programas de compliance, conforme estabelecido no escopo da assessoria prestada pelo Carvalho e Fonseca, não se resume ao atendimento à legislação, mas expandem-se na implantação efetiva e sempre em atualização de uma cultura ética nas empresas, que priorizam a gestão dos riscos e a prevenção das fraudes. Compliance, portanto, é um conjunto de disciplinas traduzidas em forma de compromisso com o mercado para fazer cumprir as leis e cultivar, no interior das empresas, uma filosofia que preze sempre por boas práticas.
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Dessa forma, a Lei Anticorrupção foi um marco na história legislativa, especialmente ao inaugurar parâmetros institucionalizados capazes de detectar desvios e puni-los de maneira efetiva, mantendo-se, assim, o equilíbrio do mercado.
Inovações promovidas e fomentadas pelo decreto
Após a promulgação da Lei Anticorrupção, apurou-se a necessidade de estabelecer ferramentas supralegais que viabilizassem o seu principal foco, qual seja, a responsabilização administrativa e civil das pessoas jurídicas. Desta feita, o Decreto nº 11.129/2022 trouxe, no art. 2º, uma inovação sobre a forma com a qual se dará a apuração dessa responsabilidade: valendo-se do exercício do poder sancionador da administração pública. Esse poder, por sua vez, será praticado via Processo Administrativo de Responsabilização (PAR) ou via acordo de leniência.
Conforme destacou Rodrigo de Pinho Bertoccelli, em artigo publicado na Folha de São Paulo, o decreto está em consonância com os indicadores internacionais da família ISO 19600, 37001 e 37301, que busca pela eficiência dos programas de integridade. Dessa forma, o decreto exige da direção das empresas a destinação de recursos financeiros, tecnológicos e humanos para o sistema de governança. Ou seja, apenas o compromisso apalavrado não é suficiente, “será necessário demonstrar o compromisso material em se construir uma cultura de integridade”.
Mecanismos de penalização e coibição
O corpo do decreto traz detalhes sobre como se dará a aplicação do Processo Administrativo de Responsabilização, sendo a competência para sua instauração e julgamento da autoridade máxima da entidade em face da qual foi praticado o ato lesivo ou, em caso de órgão da administração pública direta, do respectivo Ministro do Estado.
Além da esquematização do funcionamento do PAR, a norma conceitua e estabelece meios de aplicação para o acordo de leniência, nela definido como um ato administrativo negocial decorrente do exercício do poder sancionador do Estado, que visa a responsabilização de pessoas jurídicas pela prática de atos lesivos contra a administração pública nacional ou estrangeira. Resta claro, também, os três principais objetivos da leniência, quais sejam:
I) o incremento da capacidade investigativa da administração pública
II) a potencialização da capacidade estatal de recuperação de ativos;
III) o fomento da cultura de integridade no setor privado.
Futuro das empresas e as políticas de compliance
O escopo do acordo de leniência e as possíveis penalizações decorrentes do PAR denotam a intenção da lei em penalizar empresas que não coíbam práticas lesivas. Com o aprimoramento dos mecanismos de compliance, torna-se latente a intenção do Estado em adequar-se às exigências internacionais para operações cada vez mais éticas. Dessa forma, além de definir penalização com multa e a publicação extraordinária da decisão administrativa sancionadora, conforme estabelecido no art. 19, a norma também apresenta a conceituação do programa de integridade como um sinal do ordenamento para a prevenção de desvios.
Os programas de integridade são definidos no Decreto nº 11.129/2022 como sendo o conjunto de mecanismos e procedimentos internos de integridade, auditoria e incentivo à denúncia de irregularidades. O objetivo é na aplicação efetiva de códigos de ética e de conduta, políticas e diretrizes, com o intuito de (a) prevenir, detectar e sanar desvios, fraudes, irregularidades e atos ilícitos praticados contra a administração pública, nacional ou estrangeira e (b) fomentar e manter uma cultura de integridade no ambiente organizacional.
O decreto em discussão, portanto, é uma força para a instrumentalização da governança dentro das empresas, deslocando o discurso de integridade para a prática.