Em recente e controversa decisão, o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região determinou que o Conselho Administrativo de Defesa Econômica inclua em sua competência, ao analisar a legalidade de fusões e aquisições, os impactos que esses procedimentos causarão no mercado de trabalho.
A medida, proferida no bojo de processo que julga fusão entre duas empresas do ramo alimentício, firmou-se como paradigmática ao estabelecer que o CADE tem por obrigação fundamentar suas decisões considerando os efeitos sobre o quadro de trabalhadores vinculados às empresas, como riscos de demissões em massa ou perda de postos de trabalho.
Fundamentação e inconsistências da decisão
Provocada por ação civil pública interposta pelo Ministério Público do Trabalho, a decisão foi proferida após instauração de inquérito civil para investigar demissões e recontratações na nova entidade empresarial formada. Em julgamento de 1ª instância, a ação ajuizada pelo MPT foi julgada improcedente, sendo posteriormente reformada pelo colegiado do TRT.
Sob o argumento central de que o CADE “tem como parte das suas atribuições considerar na análise das operações empresariais suas repercussões nas funções sociais da propriedade, da livre iniciativa e do valor social do trabalho, nos termos da Constituição Federal”, a relatora do processo decidiu a favor do MPT. Contudo, ao proferir decisão que reinterpreta as competências da autarquia, o tribunal desconsiderou o processo de fusão anteriormente conduzido pelo próprio CADE – e que ratificou a formação do novo corpo empresarial.
Dentro deste contexto, se cabe ao CADE zelar pela livre concorrência do mercado, parece-nos bem claro que impor ao órgão balizas de outra ordem ou competência quando decidir sobre assuntos de livre concorrência significará, em última análise, distorcer e dificultar em muito sua atuação. Isto porque esta é a entidade responsável, no âmbito do Poder Executivo, não só por investigar e decidir, em última instância, sobre matéria concorrencial, como também fomentar e disseminar a cultura da livre concorrência.
Dissonância com a função do CADE
Dentre as atribuições do CADE, está o dever de investigar e fiscalizar processos que possam macular a livre concorrência. Esse estado de liberdade, portanto, é o coração do órgão, que se orienta sempre no sentido de preservá-lo para a plena atividade empresarial. Dessa forma, em um processo de fusão ou aquisição, cabe ao conselho acompanhar de perto se o método empregado está de acordo com as leis nacionais, sem desvios ou melindres com os parâmetros de livre concorrência. Qualquer medida da autarquia para além disso provoca, em sua atuação, um paradoxo de atentar contra o princípio que justifica sua existência, especialmente quando tal determinação de abrangência da atuação vem do Poder Judiciário.
Em outras palavras, se não submetido à decisão ora analisada, o CADE continuaria a desempenhar seu papel natural nos processos de fusão e aquisição. Os efeitos da ordem emanada do TRT15 podem representar, além de excesso de ingerência, uma deturpação no propósito da autarquia, que, verificadas as condições salutares de procedimentos empresariais, deve aprová-las sem invadir outras searas (que possuem, pelo ordenamento jurídico brasileiro, seus mecanismos próprios de proteção).
O processo foi votado pela 3ª Câmara da 6º Turma do TRT, sob o número 0012149-49.2014.5.15.008