Sócio William Carvalho comenta sobre a cláusula MAC, sua relevância e aplicabilidade em contratos de M&A

As operações de M&A, termo difundido e popularizado ao longo dos últimos anos, são as operações de fusão ou aquisição de uma empresa. Em artigo publicado no site do escritório, intitulado O processo de fusões e aquisições em linhas gerais, sublinhou-se como tais procedimentos são minuciosos e envolvidos por etapas que compreendem diferentes profissionais e sindicâncias, destacando-se o momento de assinatura do contrato (signing) e o momento em que seus efeitos começam a eclodir (closing).

Às operações de M&A em que ambos os momentos – assinatura e produção de efeitos – coincidem, dá-se o nome de fechamento imediato ou instantâneo. Às operações em que há um intervalo entre esses dois marcos, dá-se o nome fechamento diferido, e é essa modalidade que aqui nos interessa pois, devido a ela, fez-se necessária a criação da cláusula MAC – Material Adverse Change.

Importância da cláusula MAC

O processo de M&A, via de regra, exige não só o trabalho de profissionais capacitados para conduzi-lo como também tempo para que ele seja feito da maneira mais transparente possível. Para citar algumas etapas, de maneira geral, há a larga discussão das cláusulas do contrato, a elaboração de um memorando de entendimento e a realização de uma due diligence. Ou seja, apresentados os caminhos e as partes, exibidos os materiais de apoio e formada a rede interessada na operação de fusão ou de aquisição, adentra-se ao período de análise das condições da empresa e concretização, com o primeiro ajuste definido no Acordo de Confidencialidade.

Todo esse procedimento, além de prévio aos efeitos do negócio em si, exige meses de execução. A due diligence (ou diligência prévia), por exemplo, é o momento em que se faz uma investigação aprofundada no objeto do contrato. Documentos diversos são analisados e dados de diferentes naturezas – financeiros, tributários, trabalhistas etc. – são levantados para seja traçado um retrato fiel do alvo da operação de M&A.

Então, partindo da essencialidade dessas longas etapas, que precisam ser respeitadas, como resguardar as partes de algo extraordinário que possa acontecer nesse intervalo? Criou-se, então, a cláusula MAC, que versa sobre mudança adversa material.

Contexto histórico

Em artigo publicado pela Revista Semestral de Direito Empresarial da UERJ, o pesquisador Matheus Sprenger Neubauer da Costa destaca ser a cláusula MAC uma inovação com origens na common law, sistema de Direito próprio dos países anglo-saxões e que se diferencia do civil law.

Por basear sua estrutura de aplicação e aperfeiçoamento no parecer, o common law é mais fluido e móvel, originando inovações como o dispositivo ora estudado. Após sua consolidação nesse sistema, a cláusula foi incorporada nas transações de M&A de diferentes jurisdições, incluindo o Brasil. Valendo-se da liberdade contratual que rege as relações negociais, as partes passaram a se precaver de ocorrências inesperadas que alteram substancialmente o acordo de fusão ou aquisição em trânsito.

Assim, a cláusula MAC transformou-se em ferramenta recorrente nos contratos firmados no país e no mundo.

Contexto de aplicação

Sem dúvidas, muitos outros eventos inesperados podem ilustrar a necessidade da cláusula MAC, mas a pandemia de COVID-19 é o mais recente e forte exemplo de como esse dispositivo pode ser relevante em um acordo. Já destacamos como o processo de M&A pode ser demorado e, nesse tempo desde as ações prévias até o fechamento, eventos sérios, gravosos e alheios à razoabilidade podem impactar o negócio.

O artigo 393, do Código Civil, determina que “o devedor não responde pelos prejuízos resultantes de caso fortuito ou força maior, se expressamente não se houver por eles responsabilizado”. No parágrafo único do dispositivo, define-se caso fortuito ou de força maior como fato necessário, cujos efeitos não eram possíveis de evitar ou impedir. Além desse artigo, outros dispositivos disciplinam o tratamento do acontecimento inesperado de grande impacto no acordo, deixando sinalizado aos contratantes a leitura do legislador sobre a não responsabilização ou imposição do negócio à parte compradora após ato que escapou à tratativa.

No entanto, mesmo com a proteção legal, a pandemia alertou empresários e investidores para medidas preventivas quando falamos de situações imprevisíveis atingindo as transações. Nas palavras de West Glenn, “de acordo com essa cláusula, o investidor, na posição de buy side, poderá desistir do negócio se a empresa alvo sofrer uma diminuição ou perda de seus ativos, condições, operações, resultados ou expectativas, oriundos de eventos ou ocorrências imprevistas, sem que essa desistência possa gerar ao investidor qualquer penalidade”. As incertezas e riscos extraordinários, portanto, podem – e devem – ser tratadas em uma cláusula que dê ao comprador liberdade de refazer o negócio ou mesmo dele desistir, caso seja sua vontade. Esse direito, assegurado na lei, pode ser significativamente reforçado na cláusula MAC, que requer uma estipulação profissional para que as partes a entendam de maneira clara e sua previsão seja incontestável caso assim exija a operação de M&A em curso.