Em recente julgamento, com publicação de acórdão em 9 de maio de 2024, o Superior Tribunal de Justiça fixou importante precedente ao decidir o Tema Repetitivo 769. Em suma, o colegiado, diante de três questionamentos norteadores, decidiu sobre a possibilidade de penhora sobre faturamento de empresa, sendo estes os questionamentos:
I. da necessidade de esgotamento das diligências como pré-requisito para a penhora do faturamento;
II. da equiparação da penhora de faturamento à constrição preferencial sobre dinheiro, constituindo ou não medida excepcional no âmbito dos processos regidos pela Lei 6.830/1980;
III. da caracterização da penhora do faturamento como medida que implica violação do princípio da menor onerosidade.
Esgotamento das diligências e menor onerosidade
Relatado pelo ministro Herman Benjamin, o repetitivo sanou divergências quanto à novidade trazida pelo Código de Processo Civil de 2015. No artigo 835 do diploma, o legislador estabeleceu treze espécies de bens sobre os quais recairá a penhora, estando a penhora sobre o faturamento na décima colocação.
Embora o rol seja taxativo, a ordem de prioridade não se sustenta em casos em que o magistrado julgar, desde o início, infrutíferos os outros meios de penhora acima da penhora sobre o faturamento. Ou, em outra hipótese, o magistrado poderá determinar a penhora sobre o faturamento como meio alternativo a outros bens de difícil alienação.
Ao relativizar a ordem de prioridade estabelecida no CPC o tribunal, então, investe o julgador com a prerrogativa de, a partir de sua análise, encurtar esse procedimento. Trata-se de uma medida que atende à celeridade e à economia processual, porém que esbarra no princípio da menor onerosidade – parâmetro estabelecido em lei para o deferimento da penhora de faturamento. Para solucionar essa questão, o tribunal, mais uma vez, recorre ao poder julgador para afastar eventual ilegalidade quanto a menor onerosidade, pois, se a partir do que decide o juiz são inócuos os outros meios, resta ao credor os meios lícitos e frutíferos, sendo um deles a penhora do faturamento.
Importante destacar que, para que não se macule a decisão, ela deverá ser precedida pela nomeação do administrador, que se incumbirá do plano de pagamento, sem que este entre em conflito com as ferramentas autorizadas pelo magistrado. Sob essa visão, portanto, não há que se falar em violação do princípio da menor onerosidade, pois a sobreposição da penhora sobre faturamento é estabelecida a partir da inequívoca necessidade da medida para levantamento dos valores.
Constrição e penhora de faturamento
Na decisão do tribunal, há a menção à penhora de faturamento, “listada em décimo lugar na ordem preferencial de bens passíveis de constrição judicial” e a constrição judicial, que exime a “observância da ordem de classificação estabelecida em lei, se a autoridade judicial, conforme as circunstâncias do caso concreto, assim o entender (artigo 835, parágrafo 1º, do CPC), justificando-a por decisão devidamente fundamentada”. Em seguida, o acórdão esclarece que “a penhora de faturamento não pode ser equiparada à constrição sobre dinheiro”, denotando assim diferença entre ambas.
O conceito de faturamento não se resume à disponibilidade atual de valores em uma conta de titularidade da empresa. Em suma, a penhora de faturamento atinge a receita como um todo, expandindo-se sobre o que há disponível e sobre a expectativa de recebimento da empresa, o que a faz representar um impacto mais extenso do que o mero bloqueio de valores disponíveis – constrição.
A diferença de abrangência entre penhora de faturamento e constrição de valores é a tônica de parte do acórdão, que autoriza uma e outra. Mais uma vez, compete ao juiz analisar os pormenores do caso para decidir-se, no entanto, a decisão do STJ estabelece como pré-requisito a fundamentação minuciosa demonstrando a necessidade da sua decisão.
Resumidamente, o julgamento do Tema 769 estabelece diretrizes gerais para a determinação de penhora de faturamento e constrição de valores “fora da ordem” estabelecida no Código de Processo Civil. Embora, no acórdão, esteja explicado a não ofensividade ao rol de prioridades, argumentos contrários à decisão são pertinentes quando se discute o esgotamento legal da listagem, pulando-se etapas de penhoras anteriores por força do que entende o julgador. Apesar dos esforços dissidentes, fato é que o repetitivo fundou novas teses, todas favoráveis ao credor, para que os valores devidos pela empresa sejam alcançados.