Sócia Fabiana Fonseca comenta decisão do STF que afirma a validade de negociações coletivas que suprimem direitos trabalhistas

Em sessão realizada no dia 02 de junho, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu um importante precedente na aplicação das leis trabalhistas. Por maioria de votos (7 a 2), a corte decidiu que acordos ou convenções coletivas de trabalho que limitam ou suprimem direitos trabalhistas são válidas, desde que assegurado um patamar civilizatório mínimo ao trabalhador, ou, em outras palavras, que sejam preservados os direitos constitucionalmente resguardados.

Detalhes do caso concreto

O julgamento se deu em razão do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1121633, com repercussão geral reconhecida (Tema 1.046). Trata-se de contestação à decisão do Tribunal Superior do Trabalho, que deu razão ao afastamento de norma coletiva que previa o fornecimento, pela recorrente, de transporte para deslocamento dos empregados ao trabalho e a consequente supressão do pagamento do tempo de percurso.

Ao receber decisão determinando o pagamento das “horas in itinere” (horas de deslocamento), a despeito de negociação prévia estabelecendo o contrário, a recorrente acionou o STF sob o argumento central de que o TST feriu o princípio constitucional da prevalência da negociação coletiva.

Maior autonomia para as partes: efeitos da Reforma Trabalhista

Promulgada em 13 de julho de 2017, a Lei nº 13.467 provocou profundas alterações na Consolidação das Leis do Trabalho. Com o objetivo de adequar a legislação às novas relações de trabalho, a Reforma Trabalhista – como é comumente conhecida –, desde a sua origem, orientou-se pela prevalência do acordado sobre o legislado. Conforme destacado em artigo publicado à época pelo Carvalho e Fonseca, é importante destacar este ponto em específico, pois ele concentra em si o cerne do que foi abordado e discutido na decisão aqui comentada, especificamente sobre a validade do ajuste de vontade dos envolvidos e o que se estabelece dentro dos contratos e acordos trabalhistas.

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Antes da reforma, o legislador não havia cuidado em estabelecer os limites e possibilidades das negociações coletivas. Após, diversos pontos ressaltados na lei foram dados como passíveis de acordos e flexibilização, sempre respeitando os limites constitucionais. Nas palavras do relator da decisão ora discutida, Gilmar Mendes, “a supressão ou redução deve, em qualquer caso, respeitar  os direitos indisponíveis, assegurados constitucionalmente”.

Assim, a constitucionalidade de acordo coletivo que restrinja direito trabalhista se dá na medida em que as cláusulas discutidas e fixadas não firam “um patamar civilizatório mínimo, composto, em linhas gerais, pelas normas constitucionais, pelas normas de tratados e convenções internacionais incorporados ao direito brasileiro e pelas normas que, mesmo infraconstitucionais, asseguram garantias mínimas de cidadania aos trabalhadores”.

Dessa forma, como as “horas in itinere” estão atreladas ao salário e à jornada de trabalho, temáticas passíveis de serem abordadas por ajustes coletivos de trabalho, as negociações a esse respeito são não só autorizadas como o que se originou delas deve prevalecer para fins de aplicação.

Tese fixada

O Supremo Tribunal Federal, ao julgar a matéria, fixou a tese de constitucionalidade dos acordos e convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuam limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.