Sócia Fabiana Fonseca comenta a utilização das quotas em tesouraria em sociedades limitadas

As quotas em tesouraria, seguindo as dinâmicas de funcionamento utilizadas nas sociedades anônimas, têm obtido adesão também nas sociedades limitadas. Utilizado como instrumento para manutenção e consistência da empresa, como meio de expansão do capital social da organização ou como ferramenta para atração de novos investidores, o mecanismo, cuja utilização foi consagrada nas sociedades anônimas, tem sido útil também nas sociedades limitadas. Esses, aliás, são apenas cenários dos efeitos de aplicação desse tipo de quotas, que têm por natureza a aquisição de parcela da sociedade por parte da própria sociedade, fortalecendo o negócio e evitando, por exemplo, a desvalorização da participação em um momento que a empresa esteja se estruturando ou reestruturando.

Norma objetiva e suplementar

As quotas em tesouraria, até 2017, eram objeto de constante discussão quanto à sua legalidade dentro de sociedades limitadas. Enquanto a sua viabilidade dentro das sociedades anônimas sempre foi inconteste, discussões sobre sua aplicação subsidiária dentro das limitadas eram objeto de discordância. Até mesmo o Código Civil, de 2002, mostrou-se insuficiente para regulamentar o assunto, embora tenha aberto espaço para a incidência subsidiária da Lei nº 6.404/75 na regulamentação das sociedades limitadas.

Para colocar fim nessa discussão, o Departamento de Registro Empresarial e Integração – DREI editou a Instrução Normativa nº 38/2017, que tem como condão alterar os manuais de registro de diversas formas de organização empresarial, incluindo a sociedade limitada. Dentre os dispositivos desta instrução, restou sanado o problema das quotas em tesouraria nas sociedades limitadas, estando elas autorizadas a serem utilizadas neste tipo de organização.

Funcionamento das quotas em tesouraria

Inicialmente, a norma estabelece que as quotas em tesouraria não podem integrar a sociedade limitada desde a sua constituição. Em outras palavras, elas devem sempre ser decorrentes da saída de um sócio ou expansão do capital social da empresa, pós fundação. Desta forma, protege-se a organização de um surgimento não vinculado integralmente a agentes de fora da sociedade, atestando a materialidade daquele ente comercial.

Derivadas de um momento posterior ao início da empresa, as quotas em tesouraria são importante instrumento de concentração do poder empresarial dentro da própria sociedade, bem como criação de uma reserva para atração de investidores ou mesmo colaboradores essenciais, como o caso de elas serem utilizadas para atendimentos dos contratos de stock options. Neste último, as quotas agiriam como atrativo para a contratação de mão-de-obra especializada, algo comum em startups e empresas de tecnologia, em que o contrato de trabalho é assinado normalmente, mas há um atrativo a mais: o contrato de participação na sociedade, com oferta de uma fração ao recrutado.

Para saber mais sobre stock options, confira o artigo Marco legal das stock options é aprovado no Senado e estabelece regulamentação para a modalidade clicando AQUI.

Restrições e vantagens

Embora as quotas em tesouraria suspendam o poder de voto e deliberação daquela parcela de capital, enquanto ela estiver sob propriedade da sociedade, esse “decréscimo” político pode ser necessário quando o que se pretende é manter o poder econômico e de valorização sob regência da sociedade.

Esse instrumento, aliás, também pode ser utilizado para integrar contratos de usufruto, denotando a importância de a propriedade das quotas cristalizarem-se como sendo da sociedade, porém sua posse e frutos dela serem destinados a interessados em integrar a empresa.

As quotas em tesouraria são um avanço na constituição social de sociedades limitadas. Embora elas reduzam a envergadura deliberativa da empresa, elas formam uma reserva essencial para a expansão econômica e estrutural da organização, sem maiores custos, senão representando a garantia de futuros aportes em função de suas negociações.