Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo firmou importante precedente quanto aos limites da sentença arbitral e sua impossibilidade de analisar o mérito de sanções do poder público. Considerando-se que a escolha pela arbitragem está não só respaldada em lei, como é incentivada pelo legislador e pelo Poder Judiciário, resta necessário analisar os desdobramentos do acórdão.
Resumo do caso
Fundamentada sobre o argumento central de que o tribunal arbitral não possui competência para analisar o mérito da aplicação de penalidades contra concessionárias de serviços públicos, o TJSP estabeleceu que, à arbitragem, cabe apenas o julgamento de seus reflexos econômicos.
Em suma, trata-se de um caso em que o ente federado recorreu à corte para reafirmar a declaração de caducidade por parte do município, em função da má prestação de serviços da empresa concessionária. Esta, por sua vez, havia recorrido ao tribunal arbitral por entender que “as partes ajustaram no contrato que todas as matérias ali contidas, inclusive os temas de intervenção e caducidade, seriam resolvidas por arbitragem, inexistindo vedação legal ou exceção contratual que as impeçam”.
Diante da cláusula compromissória, o tribunal arbitral negou a caducidade, o que levou ao recurso ao Tribunal de Justiça de São Paulo, que o acolheu e reafirmou a prerrogativa do município de aplicar sanções em razão do descumprimento da obrigação.
Direitos submetidos à arbitragem e fundamentos da decisão
A lei que versa sobre licitações e contratos administrativos é clara quando dispõe, em seu artigo 151, parágrafo único, que, nas contratações por ela regidas, poderão ser aplicados “meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias” desde que relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, “como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações”. Nessa última citação, especificamente, está a dimensão dos reflexos econômicos cabíveis à sentença arbitral – e citados pelo relator do caso, desembargador Coimbra Schmidt.
Diante do argumento de indisponibilidade do direito de rescisão conferido ao poder público, para a corte, a jurisdição arbitral está automaticamente afastada. Ao caracterizar-se como prerrogativa da qual a administração pública não pode se desfazer, dispor ou negociar sobre onde será tratada, necessariamente a resolução extrajudicial não mais a alcança, posicionando-se fora dos limites da sentença arbitral analisar se a medida é ou não válida.
O relator ponderou, no entanto, ser possível que a arbitragem analise questões como o cálculo de indenizações em decorrência da rescisão, conforme previsto na parte final do dispositivo de lei trazido ao texto. Aliás, ao especificamente tratar sobre o assunto, o legislador fez questão de mostrar como se sobrepõem algumas faculdades do poder público à convenção das vontades. Para a corte, em suma, “a jurisdição arbitral relativa à aplicação de sanções é limitada ao exame de seus reflexos patrimoniais, porquanto irradiadas do exercício do poder de polícia, constituindo prerrogativa indelegável do poder público”.
O processo tramita na corte sob o número 1008052-51.2021.8.26.0286